Ispa N1 Minuto | Newsletter #35 – Novembro 2023

“Tem novas notificações”

Carla Fernandes, Professora do Ispa

Visualizamos uma era em que muito do que vivemos é experienciado através de artefactos tecnológicos, em que nos escudamos atrás de ecrãs e somos reféns de redes sociais virtuais, onde o valor de alguém se mede pelo número de seguidores.

Partilhamos conteúdos em conversas (chat) de grupo ou mensagem privada. Intensificam-se preocupações sobre o impacto na forma como adquirimos conhecimentos e interagimos. Relatam-se aumentos de estados de ansiedade, fadiga e uma maior propensão para a distração e dificuldades em gerir frustração e tédio.

Publicam-se vivências virais de momentos que ficam mais bem registados na memória de um telemóvel do que na nossa própria memória, histórias filtradas que alimentam (feed) a dependência de validação externa.

É imperativo verificar o estatuto destes artefactos. Ferramentas indiscutivelmente úteis e facilitadoras de diversas atividades, mas não insubstituíveis, ao contrário das verdadeiras trocas sociais – onde reforçamos competências chave, que qualificam o perfil do Ser Humano.

Priorizemos o que é prioritário. Comecemos por nos preocupar mais com a gestão da nossa “bateria social” e menos com a do telemóvel. Sempre que possível, troquemos: as páginas da internet pelas de um livro, a inteligência artificial pela real, os emojis pelas genuínas expressões emocionais, os likes pelas manifestações de afeto e cuidado, a crítica pelo pensamento crítico, as “reels-ações” pelas relações. Sejamos influenciadores e influenciados pela empatia e pelo respeito. Bloqueemos tudo o que os contraria. Recuperemos o controlo. Afinal, estas ferramentas foram desenhadas para nos servir, não o contrário.

Beatriz de Oliveira Carapeta fez o ano zero no Ispa de Beja, em 1995. Em 1996 começou a trabalhar no Ispa, não em psicologia, mas para a psicologia. No ano 2000, concluiu a licenciatura em Psicologia Clínica. Em 2004, volta à sua Alma Mater para fazer o mestrado. Entretanto, passou pela APPACDM de Santarém – trabalhando com deficiência mental – durante 17 anos. Em 2019, ruma à capital, Lisboa, para assumir a Direção Executiva do GAC – Grupo de Ação Comunitária. Assume que gostaria de voltar a estudar no Ispa pois “Uma vez Ispiana, para sempre Ispiana!”.

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Nome completo

Beatriz Sousa Pires Ribeiro de Oliveira Carapeta.

Idade

50 anos.

Situação familiar

Casada com uma filha linda e simpática, e um patudo Beagle “Cacau”.

Local de nascimento?

Lisboa, Hospital Militar Principal… já não existe!

Foi aí que cresceu?

Sim e não… Como sou filha de militar (Lisboa, Madeira, Porto, Évora, Beja), mas a residência oficial era sempre em Miraflores, conselho de Oeiras.

Se pudesse reviver algo da sua infância, o que seria?

Muita coisa, pois tive uma infância bastante feliz… Mas os cinco anos que vivi em Évora conseguia repetir e reviver sim…

Lugar preferido?

A cidade de Évora.

Tem algum passatempo? E “mania”?

Caminhar a pé e andar de carro, tanto uma como outra me traz paz e serve de terapia.

Uma coisa que faz melhor do que ninguém?

Todos fazemos coisas boas, mas creio que consigo arranjar sempre algo de positivo, mesmo quando estou em momentos difíceis.

O que a fascina?

Tudo o que tenha a ver com pessoas e com a vida!

O que os outros gostam em si?

Temos que lhes perguntar, mas a boa disposição e o rir devem ser das principais…

E o que gostam menos?

Boa pergunta… quando me chateio com alguém.

O que queria ser quando era pequena?

Desde muito pequena que dizia que ia ser educadora de infância, queria ser como a minha Mãe.

Como foi a sua formação e porque escolheu essa área?

No 10º ano tive psicologia no Liceu e adorei a disciplina e o professor… depois entrei para o Ano zero do Ispa e, claro, não consegui sair mais daqui… Fiz a Licenciatura em Psicologia Clínica de 1995 a 2000, depois tirei a Pós-graduação em Psicologia da Gravidez e da Maternidade e de 2005 a 2007 o Mestrado também em Psicologia da Gravidez e da Maternidade, esta área influenciada pela Professora Isabel Leal por quem tenho uma admiração enorme.

Foi influenciada pelos seus pais ou familiares, nesta escolha?

Não, na realidade foi mesmo no 10º ano.

Como é que iniciou a sua carreira profissional, e como foi esta decorrendo?

Um estágio profissional na APPACDM de Santarém, onde conheci a Dra. Maria do Céu Dias – Presidente – que me levou e supervisionou em consultório privado (em Santarém), em 2002 assinei contrato na APPACDM e fiquei lá até 2019. Em 2019 vim para Lisboa para o GAC – Grupo de Ação Comunitária, onde estou atualmente. Correu sempre bem pois quando se gosta do que se faz é meio caminho andado…

Como chegou ao Ispa?

Do 10º ao 12º numa escola onde houve uma espécie de “experiência de reforma educativa”, quando foi para me candidatar ao ensino superior disseram-se que eu não podia só se me candidatasse a uma universidade que tivesse ano zero… Com ajuda da minha mãe cheguei ao Ispa e percebi que já não ia conseguir sair… Era mesmo o que queria…É o melhor!

Qual é o seu maior orgulho, em termos profissionais?

Ter sempre ética e profissionalismo no que faço.

Qual foi o maior obstáculo profissional que enfrentou?

17 anos a caminhar todos os dias para Santarém para trabalhar na área (tentei mudar muitas vezes e não conseguia nada mais perto).

O que mais a motiva, profissionalmente?

Trabalhar com pessoas e para pessoas, e gostar sempre muito daquilo que faço.

Se tivesse sido algo completamente diferente, o que teria sido?

Educadora de infância, para trabalhar com crianças.

Qual a melhor forma de conhecer e dar a conhecer?

Ser transparente, ser direta…

Tem sonhos?

Tenho muitos, e espero continuar sempre a ter.

Gostava de voltar a estudar?

Espero continuar a estudar sempre, estamos sempre a aprender. Mas sim, gostava de voltar ao Ispa, mas tinha que trazer comigo todos os que estiveram cá comigo… O que já não seria possível!

Qual foi o último livro que leu?

O “Segredo do Rio” do Miguel Sousa Tavares… Para ajudar a minha filhota a fazer um trabalho…

Filme preferido?

Não sei…

Música preferida?

“A Saudade” do Fernando Daniel, faz-me estar mais perto da minha Mãe.

Imagem preferida?

A alegria de viver da minha filha e Lisboa ao por do sol.

O que é ser do Ispa?

É pertencer aos melhores: “Uma vez Ispiana, para sempre Ispiana!”.

Que pergunta gostava que lhe fizessem?

Gostei de responder a muitas destas…

Psis, humanos, demasiado humanos

Vitor Amorim Rodrigues, Professor do Ispa

– Muito obrigado por falar comigo sem marcação professor, tenho uma pergunta urgente para lhe fazer!

O brilho do olhar azul elétrico e temeroso da resposta. A minha face de expectativa.

– Sou uma pessoa ansiosa, às vezes tenho mesmo crises fortes de ansiedade desde criança. Acha que isso me impede de ir para clínica e ser psicoterapeuta? Era o meu sonho…

A partilha do sonho a exercer pressão na resposta, aguardada como um veredicto de um juiz, “diz que sim”.

– E porque não? (inversão do ónus da prova?).

– Sei lá, disseram-me que uma pessoa com problemas mentais não pode tratar outros com os mesmos problemas. É verdade?

A mesma postura ansiosa de quem atribui à resposta o poder de determinar o destino. O professor como sujeito-suposto-saber, mais, como uma nova versão do Oráculo de Delfos…

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Pouco adiantou falar da antiga tradição xamânica do curador ferido, da viagem a planos superiores, da escolha para curandeiro de quem de algum modo já estava marcado por epilepsia (a doença divina), dois espíritos ou simplesmente ataques obscuros.

Não ficou convencida. Queria apenas um sim ou um não. Sem rodeios nem explicações. Também quem se lembraria de responder a uma pergunta direta com um excurso histórico?

Talvez tivesse mais sorte se fizesse ver que a pergunta só aparentemente era simples e inocente, que vinha carregada de pressupostos não tematizados. Porquê esta exigência aos psis (psicólogos, psiquiatras, psicoterapeutas, psicanalistas)? Quem se lembraria de dizer a um cardiologista que não pode exercer por tem uma síndrome de Wolff- Parkinson-White? Ou a um oftalmologista por usar óculos? Ou por extensão a um mestre-de-obras porque a sua casa está a precisar de reparações? Não diz a sabedoria popular que “em casa de ferreiro espeto de pau”?

A pergunta não é simples nem o pode ser a resposta. O terreno das soluções diretas e simples para problemas complexos é o dos fundamentalismos e demagogias. “Ele tem a solução e eu poderia lá ter chegado e concordo, vou já votar no homem (ou mulher) de quem se fala”.

Os psis são apenas humanos, demasiado humanos diria o grande Nietzsche. Ao contrário da saída que o pensador propõe não penso que se devam sentir na obrigação de se tornar em Ubermensch, tarefa sempre impossível e que os fará sempre sentir mais em dívida do que já sentem por inerência da sua profissão.

Profissão impossível diria com razão Freud. O sofrimento cru do outro será sempre demais para os nossos recursos limitados. E a seguir virá outro e outro e outro. Há que perceber e aceitar as nossas fragilidades, somos seres perturbáveis. Por vezes, demasiado feridos para conseguir ajudar, outras, fortes o suficiente para facilitar o encontro dos nossos pacientes e ver operar-se pequenos “milagres” à nossa vista, acompanhados de gratidão que nos derrete.

Fazer a nossa terapia pessoal ajuda. Rogers ensinou-nos que estar congruentes é uma condição sine qua non para conseguirmos ajudar, mas acrescento com muitos autores que as nossas fragilidades estão sempre lá e podem ser mobilizadas a favor do avanço da terapia.

Voltamos ao curador ferido.


Estudo do Ispa confirma que os sinais químicos de medo reduzem a cegueira por desatenção

Gün Refik Semin & Nuno Gomes
Professores do Ispa

Um estudo dos investigadores do Ispa – Instituto Universitário, Gün R. Semin e Nuno Gomes, demonstrou que os sinais químicos de medo restauram os recursos de atenção e reduzem a cegueira por desatenção.

O estudo, que decorreu num cenário de realidade virtual e no qual participaram, no total, 279 estudantes do Ispa – Instituto Universitário, foi publicado no jornal Psychological Science (uma das principais revistas científicas internacionais na área da psicologia).

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A cegueira por desatenção tem a ver com a nossa incapacidade de detetar estímulos óbvios, mas inesperados, por vezes com consequências dramáticas. Este é um fenómeno conhecido na psicologia e os investigadores têm vindo a explorar ao longo das últimas décadas, não só as características deste, como também formas de reduzir o seu impacto em contextos onde este pode ser dramático.

Investigação bem mais recente, sugere que a exposição a sinais químicos de medo (suor axilar recolhido de indivíduos numa situação de medo) aumenta a aquisição sensorial e reforça a atenção de quem os recebe.

Neste estudo, os autores combinaram conhecimentos destas duas áreas de investigação com o objetivo de investigar se a exposição a sinais químicos de medo (comparativamente à exposição a suor axilar recolhido numa situação de relaxamento) reduz a ocorrência de cegueira por desatenção. Os autores previram que os participantes expostos aos sinais químicos medo detetariam estímulos inesperados com uma frequência significativamente maior do que os expostos a suor axilar recolhido numa situação de relaxamento (odor corporal de repouso).

 

Investigar a cegueira por desatenção através da lente dos sinais químicos de medo

A questão de base que os autores do estudo se propuseram responder foi: A exposição a sinais químicos do medo, ao aumentar a aquisição sensorial, reduz a ocorrência de cegueira por desatenção?

Participaram na experiência 256 estudantes universitárias do Ispa – Instituto Universitário, com idades compreendidas entre os 18 e os 40 anos. Destas, 131 foram expostas ao sinal químico de medo, enquanto 125 participaram na condição de odor corporal de repouso. Todas as participantes eram mulheres heterossexuais, caucasianas, destras e não fumadoras. Foram recrutadas apenas mulheres porque tem vindo a ser demonstrado em estudos anteriores que estas são mais sensíveis a sinais emocionais e tendo um olfato superior em comparação com participantes do sexo masculino.

Além disso, pesquisas anteriores mostraram que as mulheres percebem o suor masculino de forma diferente em função da sua orientação sexual e da orientação sexual dos dadores. Assim, apenas mulheres heterossexuais foram incluídas como recetoras no presente estudo.

Vinte e três homens heterossexuais não fumadores, caucasianos, portugueses, com idades compreendidas entre os 18 e os 36 anos participaram na experiência como dadores de suor. Os seus odores corporais foram recolhidos em duas condições emocionais distintas (i.e. estados de medo e de repouso), tendo as amostras sido recolhidas no Ispa – Instituto Universitário.

Os resultados obtidos confirmaram a hipótese, revelando que a exposição a sinais químicos de medo aumentou significativamente a deteção de estímulos inesperados em cerca de 10%.

 

Ou seja, a cegueira por desatenção foi significativamente mais evidente na condição de odor corporal de repouso (apenas 14,8% dos estímulos foram detetados). Em contrapartida, a exposição a sinais químicos de medo reduziu-a significativamente (24,4% dos estímulos foram detetados com sucesso), uma diferença de quase 10%.

Esta descobertas abre caminho à investigação com um vasto leque de implicações práticas significativas para os indivíduos envolvidos em tarefas que exigem níveis elevados de vigilância sustentada. Exemplos disso são o controlo de tráfego aéreo, a condução e a e  a examinação de imagens radiológicas.

Supondo que o aumento da capacidade de deteção de acontecimentos potencialmente inesperados é de cerca de 10% com a exposição a sinais químicos de medo, isto reduziria substancialmente a desvantagem criada pelo fenómeno da cegueira por desatenção em contextos reais, evitando erros que podem conduzir à potencial perda de vidas humanas ou a danos materiais.

 

Porquê o medo?

O medo é um estado emocional que envolve vigilância elevada. Quando sentem medo, os indivíduos tendem a contrair o músculo medial frontalis (localizado na testa), o que resulta na expansão das aberturas oculares e nasais . Isto, por sua vez, leva a um aumento do campo visual, facilita os movimentos oculares e resulta em volumes mais elevados de entrada de ar. Este estado é comummente referido como um estado de aquisição sensorial aumentada, que se supõe ter evoluído para melhorar o processamento do ambiente circundante com a função de evitar potenciais estímulos perigosos.


Conheça os últimos artigos publicados.

Albouy, R., Faria, A. M., Fonseca, P. J., & Amorim, M. C. P. (2023). Effects of temperature on acoustic and visual courtship and reproductive success in the two-spotted goby Pomatoschistus flavescens. Marine Environmental Research, 192. https://doi.org/10.1016/j.marenvres.2023.106197

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Tavares, A. I., Assis, J., Larkin, P. D., Creed, J. C., Magalhães, K., Horta, P., Engelen, A., Cardoso, N., Barbosa, C., Pontes, S., Regalla, A., Almada, C., Ferreira, R., Abdoul, B. M., Ebaye, S., Bourweiss, M., dos Santos, C. V.-D., Patrício, A. R., Teodósio, A., … Serrao, E. A. (2023). Author Correction: Long range gene flow beyond predictions from oceanographic transport in a tropical marine foundation species (Scientific Reports, (2023), 13, 1, (9112), 10.1038/s41598-023-36367-y). Scientific Reports, 13(1). https://doi.org/10.1038/s41598-023-37583-2

Tavares, S., Ribeiro, J., Graça, S., Araújo, B., Puchivailo, M., & Pereira, J. G. (2023). The first portuguese open dialogue pilot project intervention. Frontiers in Psychology, 14. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2023.1175700

Taylor, A., Summers, B., Domingos, S., Garrett, N., & Yeomans, S. (2023). The effect of likelihood and impact information on public response to severe weather warnings. Risk Analysis. https://doi.org/10.1111/risa.14222

Theeuwes, J. (2023). The attentional capture debate: When can we avoid salient distractors and when not? Journal of Cognition, 6(1). https://doi.org/10.5334/joc.251

Varatojo, S., Lavradio, L., Fernandes, A., & Garcia-Marques, T. (2023). A standardised set of images for judgements of proportion. Behavior Research Methods, 55(6), 3297–3311. https://doi.org/10.3758/s13428-022-01970-w

Verhees, M. W. F. T., Lotz, A. M., de Moor, M. H. M., van IJzendoorn, M. H., Fidder, A. A. E. J., Buisman, R. S. M., & Bakermans-Kranenburg, M. J. (2023). Effects of a soft baby carrier on fathers’ behavior and hormones: A randomized controlled trial. Journal of Child and Family Studies. https://doi.org/10.1007/s10826-023-02678-x

Fonte: Centro de Documentação do Ispa | SCOPUS

Conferência “O outro lado da moeda: contributos para a prevenção e combate ao terrorismo de inspiração islamista”

Nesta conferência, a investigadora Cátia Moreira de Carvalho, da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCEUP) apresenta três estudos que ajudam a perceber, por um lado, algumas das razões que contribuem para explicar a ausência da radicalização violenta de inspiração Islamista em Portugal, e por outro lado, o percurso de seis portugueses que se tornaram radicalizados em Londres, capital do Reino Unido.

12 dezembro | 14h00 | Sala de Atos do Ispa – Instituto Universitário.

Entrada livre.

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Cavalos-marinhos devolvidos à natureza

Foram devolvidos ao seu habitat natural os cavalos-marinhos resgatados no ano
passado na zona do pontão da Trafaria, que ficaram em risco após o colapso da
estrutura. Uma operação que envolveu o MARE-ISPA.

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